O Clube dos Anestesiados – Segunda Reunião

O Clube dos Anestesiados – Segunda Reunião

Por Alex Sandro Alves - O Escritor Dislexo



Para entender este conto, leiam primeiro os outros contos:

O Clube dos Anestesiados o primeiro encontro






A segunda reunião, um novo membro se junta ao grupo...


A sala estava novamente iluminada por uma luz fraca, como se o ambiente conspirasse para manter os segredos em penumbra. Os membros do Clube dos Anestesiados se acomodavam em cadeiras dispostas em círculo. Clara, sempre mediadora, ajeitava os papéis e olhava para cada rosto com atenção.

Naquela noite, havia uma nova integrante: Gorete, fanática religiosa, enviada pelo padre Hilário como parte de sua penitência. O padre acreditava que, ao conviver com os “pecadores confessos”, Gorete poderia expiar suas próprias culpas — aquelas que ela mesma havia omitido no confessionário.


O Julgamento de Gorete

Gorete (erguendo a voz, com um crucifixo apertado entre os dedos):  
— Vejo aqui almas perdidas, cada uma mergulhada em vícios e desvarios. O Senhor me trouxe para testemunhar e corrigir!  

Clara uma ex irmã religiosa, formada em psicologia (com calma, tentando suavizar):  
— Gorete, aqui não estamos para julgar, mas para compartilhar. Cada um traz suas dores, e o espaço é de escuta.  

Gorete (olhando fixamente para Cleonice):  
— Escuta? Escuta é o que leva muitos à perdição. A língua é arma afiada, e quem fala demais se condena.  

Cleonice (sorrindo maliciosamente, ajeitando o cabelo):  
— Ora, Gorete, não precisa se preocupar comigo. Eu só gosto de saber das histórias… afinal, alguém precisa dar movimento à vida, não é?  


O Prazer de Cleonice


Enquanto os outros membros falavam de suas angústias, Cleonice se deliciava. Cada confissão era como um prato servido à mesa. Ela anotava mentalmente os detalhes, já imaginando como iria repassar tudo depois, em conversas paralelas.

Cleonice (interrompendo uma fala de outro membro):  
— Então você disse que se arrepende de ter mentido ao chefe? Ah, isso é forte… Clara, você ouviu bem?  

Clara (intervindo, firme):  
— Cleonice, não estamos aqui para colecionar histórias, mas para compreender.  

Cleonice (com um sorriso disfarçado):  
— Claro, claro… compreender. Mas é que cada detalhe é tão… saboroso.  


O Confronto

Gorete (apontando para Cleonice):  
— Eis o exemplo da tentação! A língua que se alimenta da fraqueza alheia. Isso é pecado mortal!  

Cleonice (erguendo as sobrancelhas, fingindo inocência):  
— Pecado é esconder o que se faz, minha querida. Eu pelo menos não nego que gosto de ouvir.  

Clara (erguendo a mão, impondo ordem):  
— Basta! Este círculo não é tribunal nem praça pública. Gorete, sua fé é respeitada, mas aqui não há espaço para condenações. Cleonice, sua curiosidade precisa ser contida. Estamos aqui para acolher, não para expor.  

Um silêncio pesado tomou conta da sala. Gorete apertava o crucifixo com força, como se quisesse expulsar os demônios que via em cada rosto. Cleonice, por sua vez, sorria satisfeita: já tinha material suficiente para suas futuras conversas. Clara suspirava, consciente de que sua missão seria cada vez mais árdua.


Epílogo

Na saída, Gorete murmurava orações, convencida de que havia cumprido parte de sua penitência. Cleonice cochichava com Clara, tentando arrancar mais detalhes dos outros membros. Clara, cansada, apenas pensava: “Se este é apenas o segundo encontro, o que será do terceiro?”

FIM 

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