O Legado de Ataliba — Um conto filosófico em Guarapuava


Aqui está um conto envolvente e reflexivo, ambientado em uma noite fria de inverno em Guarapuava interior do Paraná, com protagonista o Filósofo Ataliba, personagem recorrente de outros contos já publicados neste blog. Boa leitura!


🧀🍷 O Legado de Ataliba — Um conto filosófico em Guarapuava

Era uma noite gelada em Guarapuava. O vento soprava pelas frestas das janelas como se quisesse participar da conversa que se desenrolava na sala aquecida pela lareira. A mesa estava posta com esmero: lasanha fumegante, queijos finos e um vinho encorpado que tingia as taças com um rubro profundo. 

Ataliba, o filósofo de Ivaiporã,  mas que tinha muitos amigos em Guarapuava e região onde sempre passava algumas temporadas — um homem de fala mansa e olhar que parecia enxergar além do tempo — havia convidado alguns de seus amigos para um jantar especial.

Estavam presentes Dona Célia, professora aposentada; Tonico, um mecânico de mãos calejadas e coração mole; e Marina, jovem artista que pintava com a alma entre outros convidados e seus filhos que se divertiam na sala de tv. Todos sabiam que Ataliba não oferecia apenas comida — ele servia ideias.

Após o segundo gole de vinho, Ataliba se levantou, apoiando-se levemente na cadeira. O silêncio se fez como se até o vento lá fora tivesse parado para ouvir.

— Meus amigos — começou ele, com voz grave e serena —, hoje quero falar sobre algo que nos une mais do que qualquer laço de sangue ou amizade: a certeza da morte.

Tonico engasgou levemente com um pedaço de queijo. Marina franziu a testa. Dona Célia apenas sorriu, como quem já esperava por isso.

— Vivemos como se o amanhã fosse garantido — continuou Ataliba —, acumulamos bens, buscamos títulos, construímos muros e colecionamos vitórias. Mas no fim... nada disso nos acompanha. O túmulo não tem bolsos.

Ele fez uma pausa, serviu mais vinho em sua taça e olhou para o fogo.

— O que permanece, se algo permanece, é o legado. E não falo de heranças materiais. Falo das marcas que deixamos nas almas que tocamos. Um gesto de bondade, uma ideia que transforma, uma arte que inspira, uma vida que ensina.

Marina, tocada pelas palavras, perguntou:

— Mas e se nosso legado for esquecido?

Ataliba sorriu com ternura.

— Então ele cumpriu seu papel enquanto pôde. O legado não é eterno, Marina. Ele é como uma vela acesa na escuridão: ilumina enquanto dura. E às vezes, essa luz é suficiente para acender outras velas.

Dona Célia levantou sua taça.

— Às velas que acendemos, então.

Todos brindaram. O vinho parecia mais quente, a lasanha mais saborosa, e o frio lá fora menos cruel.

Naquela noite, em meio ao aroma de queijo e vinho, os amigos de Ataliba não apenas se alimentaram — eles foram nutridos por uma verdade profunda. E embora o tempo apagasse os detalhes daquele jantar, as palavras do filósofo ecoariam por muito tempo nos corações que ali estiveram.



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