O Mito da Taberna de Ataliba
Diz-se que numa encruzilhada esquecida pelo tempo, cercada de mato ralo e promessas não cumpridas, existia uma velha construção de madeira torta e fumaça espessa: a Taberna, espécie de boate ou bar medieval passado de pais para filhos por gerações.
Os proprietários não eram apenas por ofício simples proprietários. Eram guardiões e prestadores de um serviço social. De geração a geração, suas mãos calejadas serviam copos como quem ministra ritos sagrados, e sua taverna era o último reduto dos que sabiam — mesmo que inconscientemente — que haviam caído de um trono que nunca viram, mas sentiam saudade.
Os frequentadores da Taberna eram chamados de “os herdeiros esquecidos”. Todos tinham os olhos pesados de uma nobreza perdida. Caminhavam curvados não de idade, mas de cansaço — do peso de um mundo que os convenceu de que nasceram para obedecer.
— “Bem-vindo de volta ao esquecimento,” diziam os taberneiros, servindo o primeiro gole ao recém-chegado.
Ali, entre as mesas manchadas de histórias e as paredes que não julgavam, todos esqueciam da semana exaustiva de trabalho, dos impostos excessivos e absurdos, das hierarquias inventadas.Da injustiça social.Esqueciam que um dia foram reis de si mesmos, antes de se venderem por falsas promessas de estabilidade e rotina.
Havia música tocada por um cego que enxergava demais. Havia mulheres que dançavam semi nuas e iam deitar-se nos quartos de hotéis baratos nas redondezas, não por prazer, mas por sabedoria e necessidade — dançavam pois sabiam que o corpo é uma das últimas armas que a alma aprisionada ainda pode controlar. Alugavam seus corpos para dar prazer a outros corpos por dinheiro... Pois também perderam seu direito de nascença de realeza e se tornaram escravas do sistema.
E havia histórias. Todas começavam diferentes, mas terminavam iguais: com um brinde silencioso à liberdade perdida.
Dizem que os mais lúcidos, ao saírem dali ao amanhecer, choravam sem saber por quê. Outros sorriam — iludidos de que aquele alívio era cura, e não anestesia.
A Taberna nunca fechava as portas. Os proprietários sabiam: o sistema nunca dorme, mas também nunca bebe. E sempre haveria quem, em desespero ou lucidez, voltaria para mais um gole de esquecimento.
#FIM#
Alex Sandro Alves
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