🥩🍻 O Dilema de Ataliba
Era um sábado de sol no interior do Paraná, daqueles em que o cheiro de carvão aceso já anuncia que o dia vai ser bom. No quintal da casa do Zé, o churrasco já estava no auge: linguiça estalando na grelha, cerveja trincando de gelada, e uma caipirinha de limão que parecia ter sido feita por um alquimista.
Ataliba, o filósofo da turma — não por profissão, mas por vocação e teimosia — estava sentado numa cadeira de plástico, com o copo na mão e o olhar perdido entre a fumaça da carne e os pensamentos que só ele parecia enxergar.
— Ataliba, tu tá com cara de quem tá pensando demais pra um sábado — disse Toninho, já meio alto, com um pedaço de picanha na mão.
— Tô, Toninho. Tava aqui matutando: será que escolher é sempre perder?
A roda se calou por um instante. Até o som do pagode no radinho pareceu baixar o volume.
— Como assim, perder? — perguntou Zé, servindo mais caipirinha.
Ataliba tomou um gole, limpou o suor da testa e começou:
— Veja bem. Toda escolha é uma renúncia. Quando escolho a picanha, deixo de lado a costela. Quando escolho ficar aqui, deixo de ir pescar com meu primo. Quando escolho casar, deixo de viver outras histórias. A gente nunca tem tudo. Escolher é sempre abrir mão de algo.
— Mas aí, Ataliba, se a gente não escolhe, fica parado — rebateu Toninho. — E parado também é perder, não?
— Justamente. A vida é um jogo onde perder é inevitável. A diferença é que, ao escolher, a gente escolhe como perder. E às vezes, no meio da perda, a gente encontra sentido.
Zé coçou a cabeça, olhou pro espeto e disse:
— Então quer dizer que escolher essa picanha agora é perder a chance de comer a costela... mas é ganhar o prazer da picanha?
— Exato — sorriu Ataliba. — A vida é feita de perdas saborosas.
Todos riram. Toninho levantou o copo:
— Então um brinde às perdas bem escolhidas!
— E às caipirinhas que ajudam a esquecer as ruins! — completou Zé.
O sol foi baixando, o churrasco continuou, e Ataliba, entre goles e gargalhadas, percebeu que talvez escolher não fosse só perder. Era também construir — com pedaços de renúncia — o mosaico da própria vida.
FIM
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