Rogério, um invejoso de passaporte cheio, sem espaço para novos carimbos, era mais azedo que suco de tamarindo vencido. Morava em Foz do Iguaçu, cidade turística, divisa com outros países turísticos, mas nunca pisou nas Cataratas nem foi na Argentina ou pro Paraguai. Dizia sempre que podia e com desprezo:
— "Pra que ver água caindo se tem torneira em casa?"
—"Pra que ir no país dos hermanos comer o churrasco em grelha e temperado com chimichue acompanhado com vinho e cerveja local? Num vejo graça, além de desperdiçar tempo e dinheiro?
Num belo domingo de sol, seu vizinho Pança (apelido carinhoso de Joel ) — conhecido pela churrasqueira turbinada e coração de ouro — decidiu organizar um mega churrasco e se cercar de amigos.
Convidou todos, até Preguiça apelido de um amigo em comum, que se chamava Pedro (que levou três horas pra chegar mesmo morando a uma quadra de distância).
Rogério, a verdadeira personificação do pecado capital a Inveja ( "Melissinha" para os menos íntimos) pois era revendedor autónomo/ambulante de calçados de diversas marcas, apelido que ele detestava, e uma vez quiz até processar Ataliba, amigo de Joel que inventou o apelido, Rogério o "Melissinha", apareceu também. Sem trazer nada. E já reclamando.
— "Esse pão de alho? No meu tempo era feito no forno a lenha, não nesse micro-ondas gourmet aí."
— "Esse vinagrete com maçã verde é coisa de fresco! Quem que trouxe?"
Experimentou a picanha e torceu o nariz.
— "Tem gosto de mercado barato... em casa, só carne Angus certificada, quando compro, né."
Enquanto todos riam, contavam piadas que podiam ser contadas num ambiente familiar, relembravam os bons momentos e se empanturravam de sobremessas, Rogério ficava num canto, fulminando os felizes com o olhar.
Depois tentou espalhar um boato:
— "Vocês sabiam que o Pirulito aquele baitola (apelido de Rudival) um amigo frequente nos churrascos, uma vez no churrasco em minha casa, fez eu assar primeiro a picanha que ele levou e tomou a cerveja puro malte que levou e num quiz minhas carnes descongeladas e nem minhas cervejas que já estavam na geladeira só porque estavam com sinais de ferrugem na lata? Que fresco! Enjoado...
Ainda pediu para experimentar minhas cachaças de melhor qualidade que tinha no meu barzinho reservada para pessoas importantes...
Rogério além de adepto da Inveja tinha o dom de guardar o melhor para os seletos e o de menor qualidade para os "amigos" mais frequentes, porém pobres...
Joel, vulgo "Pança" olhou para Ataliba, para sua esposa e outros amigos naquele churrasco e considerou repensar os motivos de ainda manter o relacionamento e contato com um indivíduo que além de ser o embaixador da Inveja era uma pessoa que não tinha respeito e reciprocidade com seus convidados. Consumia o melhor na casa dos outros e quando o churrasco era na casa dele, servia o pior...
Era o que Ataliba, muito espirituoso, daqueles que nunca perdia a oportunidade de fazer uma piada , nos seus velhos ditados e bordões sempre chamava de "Esse e do tipo,venha a nós o vosso reino" , ou seja, na casa dos outros queria ser tratado como rei , e na sua própria casa, tratava os outros como vassalos e idiotas úteis...
Minutos antes, Melissinha se vangloriava de ser praticante de Swing (grupo de troca de casais) o que deixou a esposa de Joel muito constrangida, além de ter jogado com o pé esquerdo o gato branco da casa que tinha o nome de Polaco, na porta da geladeira na área gourmet do churrasco...
Rogério, sem noção e sem limites, recomeçou mais uns de seus nada agradáveis sermões...
—"O carvão é contrabandeado, né? O cheiro denuncia, é carvão de qualidade questionável ."
—" Nossa sal grosso já temperado com ervas finas... Humn que coisa de gente fresca e metida a rica... Em casa é só sal grosso tradicional..."
A sabotagem do churrasco foi o auge: trocou o sal por açúcar quando ninguém via. Mas a carne caramelizada surpreendeu — ficou ainda melhor. Pança com um sorriso irônico, agradeceu:
— "Valeu, Rogério. Você é o tempero imprevisível da nossa convivência."
Moral da história: até nas paisagens mais deslumbrantes, cidades onde seriam o sonho de habitação para muitos, às vezes brota um Rogério — um improdutivo filho da Inveja, aquele ser que transforma elogio em suspiro e gratidão em recalque, um verdadeiro Arauto do pecado capital que o mundo conhece como Inveja.
Citando o grande Paulo Leminski, um grande escritor paranaense, desejo muito que pessoas invejosas que ao morrerem, na próxima reencarnação nasçam em Curitiba....
PS: Observação este é um conto fictício e sem relação com nenhuma das possíveis coincidências que o leitor possa ter presenciado, participado ou se identificado com alguns dos personagem do conto.
Grato por ler o Blog
Alex Sandro Alves
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