Onde os Maus Não Têm Vez



O grande tribunal celestial estava montado. No centro, um círculo dourado reunia as entidades místicas das maiores religiões do mundo. Sentados lado a lado, estavam Brahma, Krishna, Buda, Jesus Cristo, o mensageiro de Alá, além de Anúbis e Osíris, guardiões do além na tradição egípcia, além de uma figura feminina misteriosa. Estavam ali não para condenar por vingança, mas para julgar aqueles que, em vida, haviam causado sofrimento ao mundo.

Diante deles, as sombras dos réus se agitavam. Eram ladrões, assassinos, mentirosos e traidores. Pessoas que, no tempo dos homens, haviam ignorado a ética, explorado inocentes, destruído famílias e derramado sangue sem remorso.

Krishna, sempre sereno, tomou a palavra.

— Em vida, todos tiveram escolhas. Agora, colhem as consequências.

Jesus Cristo, o que nasceu sem pecado e venceu a morte, olhou para os réus com compaixão, mas sem absolvição, pois nem em vida mostraram arrepedimento e nem confessaram aos outros homens que Cristo era seu salvador e redentor capaz de salvar da segunda morte e do julgamento pós morte que todos ali estavam com réus! Mas para Jesus Cristo, mesmo naquele momento,  se arrependessem, seria seu advogado, pois todo seu sacrifício lá na cruz era pagamento suficiente para a redenção de toda a humanidade...

— O arrependimento verdadeiro poderia salvar suas almas. Mas muitos de vocês nem sequer tentaram encontrar a redenção.

Buda suspirou, fechando os olhos.

— Quem planta sofrimento, colhe sofrimento. O ciclo do karma é inexorável.

Osíris levantou sua mão, e a balança sagrada apareceu.

— Seus corações serão pesados contra a pena da verdade. Se estiverem carregados de injustiça, o julgamento será implacável.

O primeiro réu adiantou-se, trêmulo. Um político corrupto que desviou recursos destinados a hospitais, condenando milhares à morte.

O arcanjo Gabriel que é citado na religião Cristã, Judaismo e também no Islamismo, veio para  representar Alá, ergueu a mão.

— Seu dinheiro não pode comprá-lo aqui. Justiça não aceita suborno.

Outra sombra surgiu: um homem que passara a vida manipulando e mentindo, destruindo reputações por ambição e prazer.

Brahma olhou para ele.

— Sua mentira contaminou seu espírito. Agora, a verdade o desmascara.

Em seguida, um assassino sem remorso ergueu a cabeça, desafiador. Mas Anúbis, o guia dos mortos, encarou-o sem medo.

— Você arrancou vidas sem hesitar. Agora, enfrentará o peso do que fez.

Foi então que figura feminina que veio em nome do caido, a antiga serpente a que muitos conhecem como Lúcifer ou  Diabo,  conhecida como Lilith, aquela que segundos as lendas teria sido a primeira mulher de Adão, uma antiga entidade da tradição mística Judáica, se aproximou dos réus e andando entre eles com suas estranhas asas, com beleza de musa, mas semblante com tom demoníaco e sobrenatural, como advogada de acusação,  com seu olhar profundo e penetrante, fez com que cada um sentisse o peso de suas próprias eescolhas.

— Eu os daria parabéns por fazerem os que fizeram assim como eu fiz: rebelião e se tornar a mãe de todos os demônios e toda minha descendência fizeram abominações diábolicas desde o inicio, mas a nossa condição era sem chance de redenção e perdão.

Mas todos aqui em julgamento são seres humanos e tinham previlégio por meio do arrependimento seguir o caminho do bem, fazer caridade e reparação, poderiam recorrer ao Cristo. Todavia desperdiçaram sua herança de salvação... Mas todos vocês não foram apenas cruéis, egoistas e das mais diversas formas: pecadores. Vocês espalharam dores que se multiplicaram. Quantas mães choraram? Quantos órfãos e inocentes sofreram por suas mãos?

Os réus permaneceram em silêncio, sentindo a condenação antes mesmo da sentença final.

Foi então que Ma'at, a deusa egípcia da verdade e justiça, declarou:

—Aqueles que aceitaram sua culpa e demonstraram arrependimento verdadeiro terão a chance de aprender indo para uma dimensão que os católicos chamam de Purgatório. Mas os que continuam a negar, serão lançados ao Tártaro que hoje em dia chamam de Inferno, lá sofrerão um castigo eterno.

Os que recorrerem ao Cristo Jesus, O Nazareno, O Cordeiro Imolado, partirão pela porta estreita onde outro julgamento e destino vos será decidido.

Um portal abriu-se atrás do tribunal. Alguns poucos, que mostraram sincero arrependimento, foram guiados para um caminho de aprendizado. Os outros, aqueles que nada aprenderam, foram tragados pelo lugar eterno onde seus cuidadores seriam demônios.

No final, o tribunal celestial se desfez, retornando ao silêncio do infinito. Na Terra, os vivos ainda escolhiam seus caminhos, sem saber que, um dia, todos estariam diante desse mesmo julgamento, caso não se comporantassem.

Porque, no final, ali era um local onde os maus não têm vez.


#FIM#

Comentários