Tobias e o Grito Silencioso - um conto para o dia 15 de Novembro

Tobias acordou com o som estridente dos fogos de artifício, um barulho que, em vez de alegria, só lhe causava um embrulho no estômago. Era 15 de novembro, Dia da Proclamação da República, e os 50 anos de vida lhe haviam ensinado que nem toda festa é motivo para celebrar. Naquela manhã, em seu pequeno sobrado geminado com vista para uma rua já movimentada de Maringá, Tobias sentia o peso de um país que, para ele, parecia patinar no mesmo lugar há décadas.

Ele preparou seu café preto, forte como seu descontentamento. A televisão ligada na sala mostrava imagens de desfiles cívicos e políticos sorridentes. "Hipocrisia", ele resmungou para o bule, enquanto derramava a bebida fumegante na xícara. Desde jovem, Tobias havia acreditado nas promessas de um Brasil melhor. Lembrava-se dos discursos inflamados da juventude, da esperança que pulsava em cada eleição, em cada mudança de governo. Mas a cada ciclo, a mesma história se repetia: corrupção, descaso, a sensação de que o povo era sempre o último na lista de prioridades.

A frustração de Tobias não era apenas política; era existencial. Ele havia trabalhado a vida inteira, construído uma família, pagado seus impostos rigorosamente. No entanto, sentia que sua vida, assim como a de tantos outros brasileiros honestos, era uma batalha constante contra um sistema que parecia feito para desfavorecê-los. A saúde pública precária, a educação que mal engatinhava, a segurança pública que era uma piada de mau gosto – tudo isso fervilhava em sua mente enquanto ele assistia às celebrações na TV.

"República de quê?", ele pensou, com um suspiro pesado. Para Tobias, a palavra "república" havia se tornado uma ironia. Onde estava a res publica, a coisa pública, que deveria ser de todos e para todos? Ele via as ruas esburacadas, os hospitais lotados, as escolas caindo aos pedaços, enquanto os fogos de artifício explodiam no céu, custeados por um dinheiro que, ele sabia, poderia estar salvando vidas ou construindo futuros.

Naquele 15 de novembro, Tobias não saiu para ver os desfiles. Não acenou para a bandeira. Em vez disso, sentou-se em sua poltrona, o olhar fixo na tela da televisão, onde a oratória vazia se misturava com o som dos rojões. Sua revolta era um grito silencioso, um protesto contido no fundo da alma de um homem que, em seus 50 anos, se sentia traído por um sonho que nunca se realizava. Ele sabia que não estava sozinho nesse sentimento. Milhões de brasileiros, talvez, compartilhavam da mesma desilusão. E enquanto o país celebrava sua proclamação, Tobias apenas desejava que um dia, a república fosse, de fato, para todos.

#FIM#

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