Ataliba sempre foi um homem gentil. Ele sabia como arrancar um sorriso das pessoas ao seu redor, fosse com um comentário espirituoso ou apenas com sua presença tranquila.
Mas, dentro de si, carregava uma tempestade que nunca conseguia dissipar. A cada inverno que chegava ao sul do Brasil, essa tempestade se intensificava.
O frio cortante atravessava seus ossos, ignorando todas as camadas de cobertores, mantas, edredons e roupas pesadas que usava para ir para a cama, que em vão tentavam aquecê-lo.
Ele já passava dos cinquenta anos. Seu corpo não era mais o mesmo, castigado por problemas circulatórios e pela ameaça do diabetes que rondava sua saúde. Insônia, ansiedade, depressão— outras companheiras de longa data que se enraizaram em sua existência.
E havia algo mais profundo: a solidão. Ataliba nunca foi amado da forma que desejava e nem como merecia. Nunca jamais teve uma companheira, nunca experimentou o carinho íntimo de alguém que escolheu estar ao lado dele.
Os dias frios eram longos. As noites eram ainda mais cruéis. O pensamento recorrente de simplesmente dormir e nunca mais acordar não lhe causava medo. Ao contrário, parecia um alívio, uma solução para uma vida que, para ele, já não fazia sentido continuar.
Mas Ataliba não era imprudente. Ele ponderava. Questionava. Por muito tempo, sentiu-se culpado por considerar a possibilidade da morte auto imposta antiética ou imoral. A sociedade dizia que era errado, moralmente proibido de apenas filosofar sobre o tema. Mas, dentro dele, a ideia começava a se transformar. E se não fosse um pecado? E se fosse apenas um desfecho não natural, mas fruto de seu livre arbítrio, para alguém cuja existência já não carregava uma vida sem propósito?
Enquanto o inverno avançava, Ataliba refletia. Não buscava desespero, nem vingança contra a vida que lhe negara tantos momentos de felicidade. Apenas queria descanso. Queria paz.
Mas eis que, no meio da névoa gelada, surgiu uma faísca inesperada. Alguém percebeu sua dor. Alguém, talvez um amigo, um desconhecido, ou até uma lembrança distante, estendeu-lhe a mão. E naquele instante, Ataliba compreendeu que não precisava tomar sua decisão sozinho.
A história dele não precisava terminar assim. Porque mesmo nos dias mais frios, há sempre algo capaz de aquecer a alma.
#FIM"
Este post continua em outro conto:
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